Novos ônibus, velhos problemas

Lotação é um dos problemas que continua a perturbar os usuários, mesmo em cidades com novos ônibus


A nova frota de coletivos do Distrito Federal entregue em oito regiões — Ceilândia, Itapoã, Paranoá, Recanto das Emas, Riacho Fundo 2, Taguatinga, Vicente Pires e São Sebastião — soma 226 veículos no total. Mas não foi o suficiente para diminuir a insatisfação dos passageiros em relação ao sistema público de transporte. Atrasos, falta de veículos, superlotação e mau comportamento de cobradores e motoristas são as principais reclamações, mesmo em automóveis novos. Veículos que circulam há menos de um mês já apresentam defeito na campainha, situação flagrada pelo Correio no Paranoá.

O descumprimento de horário de algumas linhas contribui para o crescimento dos piratas que atuam livremente pela região do Itapoã sob os olhares de um fiscal de uma empresa de transporte e que, segundo ele, nada pode fazer. “É um esquema bem organizado em que todos se conhecem e dividem as linhas que vão fazer. Passam a cada cinco minutos nas paradas e nunca estão vazios”, conta Donizete Sousa.

A reportagem percorreu as ruas do Itapoã e flagrou diversas cenas de transporte ilegal. Em uma situação, era possível ver duas mulheres, uma criança de colo e um rapaz entrarem no banco de trás de um Fiat Siena. “O pirata só existe porque o transporte público deixa a desejar. As pessoas não aguentam mais ter que aguardar até duas horas por um ônibus, sem contar na possibilidade de o coletivo quebrar”, reclama a diarista Maria de Jesus da Silva, 37, moradora do Itapoã.

E com atrasos e superlotações começa o dia da doméstica Antônia Moura, 44 anos, moradora do Paranoá. Às 6h de ontem, ela aguardava na fila do terminal do Paranoá o veículo da linha 100.2, sob responsabilidade da Viação Pioneira desde 29 de julho. “Estou há 20 minutos esperando o coletivo, que já está atrasado. É um absurdo essa situação. A única coisa que melhorou foi o estado do carro, mas já ouvi falar que um deles quebrou”, revela. 

Antônia deu sorte e conseguiu se sentar. Quem não pode chegar mais cedo tem que se contentar a ir em pé. “Os veículos novos continuam lotados porque não há cumprimento do horário. E quando a gente reclama, os motoristas nos tratam mal. Eles fazem o que querem com os usuários e nós, que dependemos do serviço, somos obrigados a aceitar tudo isso”, desabafa a também doméstica e moradora do Paranoá Maria da Silva, 37.
"O pirata só existe porque o transporte público deixa a desejar. As pessoas não aguentam mais ter que aguardar até duas horas por um ônibus" Maria de Jesus da Silva, diarista e moradora do Paranoá
Menos assentos

Outro motivo que contribui para a superlotação é a redução do número de assentos dos ônibus novos, que contam com 36 lugares — 11 a menos em relação à frota antiga. “A renovação não significa que tudo funcione corretamente. A campainha, por exemplo, não funciona direito”, conta Maria da Silva. A atendente Isabela Nascimento, 22, reclama também da falta de respeito dos motoristas em não parar nos pontos. “O veículo é pequeno e não atende a demanda. Passam lotados nas últimas paradas e quem mora na parte final do Paranoá é obrigado a contar com a sorte para que outro carro venha mais vazio”, lembra. “Quando estou muito atrasada, sou obrigada a pegar dois coletivos”, conta Isabela.

A insatisfação com o sistema de transporte coletivo contribui para o aumento de ônibus queimados no DF. De acordo com o Corpo de Bombeiros, de janeiro a julho deste ano, 43 carros foram incendiados — 13% a mais se comparado ao mesmo período de 2012, quando 38 veículos acabaram atingidos. Até 22 de agosto, quatro ocorrências tinham sido registradas. Planaltina é a região que concentra o maior número de ocorrências: cinco. A revolta não está restrita aos usuários. Em 21 de agosto, um motorista da Viplan ateou fogo a um ônibus da empresa por insatisfação com as condições de trabalho. Procurada pela reportagem, a viação não se pronunciou.

Já o diretor-geral do Transporte Urbano do DF (DFTrans), Marco Antonio Campanella, alega que boa parte dos veículos queimados não são do sistema local. “Poucos carros que rodam na cidade fazem parte da estatística, apesar de o DFTrans não ter esse levantamento. Nosso sistema é velho, mas ainda é mais novo em comparação ao Entorno, e está em pleno processo de mudança.”

Carros serão monitorados
O diretor-geral do Transporte Urbano do DF (DFTrans), Marco Antonio Campanella, reconhece os problemas descritos pelos passageiros, mas critica as empresas ao afirmar que nada justifica atrasos e desrespeito aos passageiros. “Não vamos tolerar essa situação. Estamos providenciando o monitoramento da frota que atua nas regiões atendidas pelo novo sistema”, garante. Segundo ele, o governo estabeleceu prazo de 90 dias, a partir da data em que os carros começaram a circular, para que as empresas que venceram a licitação providenciem a homologação e a instalação dos equipamentos que contribuirão para a fiscalização dos veículos.

Parte da frota da Expresso São José já é monitorada pela nova rede, em fase de implantação, do DFTrans. O Correio procurou a empresa e a Viação Pioneira para comentarem o assunto, além Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros e das Empresas de Transportes Coletivos (Setransp), mas não houve retorno.Segundo Campanella, assim que a rede de monitoramento estiver completa, em dezembro, o governo vai cobrar o que foi acordado no contrato, tais como o fim dos atrasos e da superlotação. “O governo deverá apurar a qualidade do serviço por meio da criação do índice de qualidade. Estamos na fase de definir os critérios técnicos da avaliação que será feita pelo DFTrans e pelo Detran (Departamento de Trânsito do DF)”, concluiu o diretor do DFTrans.


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